sexta-feira, 14 de setembro de 2018

Mensagem na Garrafa (para quem se interessar)

Algum lugar, qualquer dia de um mês qualquer,

Estou perdida numa ilha, eu não sei onde fica mas daqui posso avistar minha vida.
Existem aqui algumas fendas nas paredes rochosas, e em uma delas tenho me abrigado à noite.
Não vejo sinal de outras pessoas, ninguém com quem eu possa manter uma conversa ou estabelecer qualquer tipo de relação.
Ás vezes vejo fantasmas, que me visitam nos piores momentos, sussurrando seus nomes e exalando perfumes que eu gostaria muito de esquecer.
Mas não tenho medo, eu já os conhecia.
Os dias passam lentos e dolorosos, sinto meu corpo doer constantemente, talvez  por abrigar minha alma ressequida. Não tenho acesso a nenhum tipo de  medicina ou entorpecente que me alivie um pouco.
Passo o dia a murmurar versos e a cantar canções miseravelmente bonitas, mas não tão alto, pois os fantasmas escutam e tornam a me atormentar.
Encontrei a pouco tempo um marinheiro, que me parecia perdido também, me contou histórias de terras longínquas e me fez companhia por vezes quando alua deixava de iluminar esse lugar tomado por sombras.
Eu ri de suas piadas e descansei um pouco enquanto ele vigiava o perigo ao redor. Por pouco as vozes sumiram.
Certo dia, fui tomada por um rompante que me encheu de calor e senti a ilha estremecer, eu disse a ele que o amava. Estava eufórica, estava feliz.
Mas o pobre marinheiro nunca esteve perdido, ele sempre soube o caminho de casa e nela morava sozinho.
Ele se foi.
Nos últimos dias, eu aprendi a fazer fogo, isso me foi útil, eu consigo iluminar a ilha por algumas horas me afastando um pouco da penumbra, uso o carvão que sobra entre as cinzas para escrever nas paredes do meu abrigo coisas sobre amor, sobre ops dias que nunca vivi e coisas que eu nunca provei. Me mantém ocupada de tal forma que penso ser importante e lembro do meu próprio nome.
Tenho ficado muito aqui dentro, olhando pela fenda a chuva que se instalou lá fora.
Que tempestade, que aguaceiro medonho!
Não tenho como sair e minha lenha está acabando.
Mas caro leitor, isso não é um pedido de socorro. Não é um lamento, é a minha história.
Eu naufraguei em meu pranto, minha nau não era tão pomposa, mal tinha velas, era um verdadeiro desastre que infelizmente não comportou o peso da minha esperança ou do amor que eu trazia contrabandeado no porão.
Era tudo o que eu tinha. E se foi nas águas.
Talvez eu não saiba mais o que estou falando, o fogo está acabando e meu corpo frio começa a adormecer, talvez pra sempre ou pra nunca mais.
Ainda chove lá fora e a maré está alta.
Ponho esta mensagem numa garrafa vazia do último porre que tomei e a lanço, talvez alguma rede a arraste num dia de sol, ou talvez, ela se perca pra sempre.
Se alguém está lendo, saiba que fui um dia uma mulher, que teve a ousadia de tecer sonhos e dessas tramas ordinárias fez estandarte e discursou com convicção que só aceitaria a felicidade e nada mais. Acabou perdendo tudo o que tinha de mais precioso por oferecê-lo a quem não tinha zelo.
Isolou-se e se abrigou no próprio coração.


Nenhum comentário:

Sua assinatura não pôde ser validada.
Você fez sua assinatura com sucesso.

Newsletter

Assine nossa newsletter e receba conteúdo exclusivo.

Usamos a Sendinblue como nossa plataforma de marketing. Ao clicar abaixo para enviar este formulário, você reconhece que as informações fornecidas por você serão transferidas para a Sendinblue para processamento, de acordo com o termos de uso deles